- Introdução
A recuperação judicial foi instituída no Brasil pela Lei 11.101/2005, também chamada de Lei de Recuperação e Falência (LRF) (BRASIL, 2005), com o objetivo de fornecer um mecanismo de reestruturação para empresas em crise econômico-financeira. Trata-se de um instituto essencial para a preservação da operação empresarial, permitindo que companhias enfrentem dificuldades temporárias sem que tenham que recorrer imediatamente à falência, garantindo a continuidade da atividade empresarial e a preservação de empregos desta decorrentes.
O instituto foi inspirado em modelos internacionais de reestruturação, especialmente no Chapter 11 do Bankruptcy Code dos Estados Unidos – também chamado de Lei da Bancarrota –, que possibilita uma renegociação mais flexível com credores e a continuidade da atividade empresarial sob supervisão judicial. No Brasil, o procedimento busca conciliar os interesses dos devedores, credores e da economia em geral, equilibrando a necessidade de pagamento das obrigações com a viabilidade da empresa em crise.
Contudo, apesar da relevância do procedimento de recuperação judicial, passados quase vinte anos desde sua implementação, persistem dúvidas quanto à sua efetividade. Muitos processos resultam em convolação em falência, e a taxa de sucesso das recuperações judiciais é considerada baixa. Dados do Serasa Experian (2018) apontam que uma parcela significativa das empresas que ingressam com o pedido de recuperação não consegue cumprir seu plano, evidenciando desafios práticos na aplicação do instituto.
Nesse sentido, os principais entraves estão relacionados à morosidade processual, à burocracia na fase inicial e às dificuldades enfrentadas na negociação com credores. O tempo entre a distribuição do pedido e o deferimento do Stay Period (período de 180 dias de suspensão das cobranças, conforme o art. 6º da LRF) é um fator crítico. Processos demorados podem comprometer ainda mais a situação financeira da empresa, reduzindo suas chances de recuperação efetiva.
Além disso, há uma clara assimetria informacional entre credores e devedores. Conforme apontado por SZTAJN (2007), a exigência de documentos detalhados, prevista no art. 51 da LRF, tem o objetivo de mitigar essa assimetria, mas, na prática, acaba tornando o procedimento mais burocrático e oneroso. Muitas empresas em dificuldades não possuem todos os registros exigidos pela legislação, o que prolonga ainda mais a fase inicial da recuperação.
Outro fator relevante é a ausência de incentivos para que os credores aceitem planos de recuperação que possam viabilizar a reestruturação empresarial. Os credores quirografários, em especial, frequentemente preferem a falência da empresa para tentar recuperar parte do crédito em vez de aceitar um plano de pagamento parcelado e sujeito a incertezas. Essa dinâmica afeta diretamente o sucesso do procedimento e dificulta a sua efetividade prática.
Adicionalmente, a recuperação judicial no Brasil enfrenta desafios relacionados ao tratamento dos créditos tributários. A legislação atual não permite a inclusão desses débitos na recuperação, o que significa que a empresa continua obrigada a pagar suas obrigações fiscais, independentemente da renegociação com credores privados. Como consequência, muitas empresas em recuperação judicial acabam tendo sua viabilidade comprometida pela impossibilidade de regularizar sua situação fiscal e acessar novas linhas de crédito.
Outro problema frequentemente apontado é a falta de especialização dos magistrados responsáveis por julgar processos de recuperação judicial. A sobrecarga das varas empresariais – e até mesmo a ausência destas em alguns Estados – e a ausência de um corpo técnico especializado para lidar com questões contábeis e financeiras tornam o procedimento mais demorado e imprevisível. Em países como os Estados Unidos, juízes especializados no tema garantem decisões mais ágeis e fundamentadas, o que contribui para a eficácia do processo.
Diante desse cenário, o presente artigo possui como objetivo analisar a eficiência do procedimento de recuperação judicial sob a ótica da reestruturação empresarial. A pesquisa abordará os principais desafios enfrentados pelas empresas que recorrem ao instituto, incluindo os entraves processuais, a dinâmica da negociação com credores e a necessidade de reformas na legislação vigente.
A partir dessa análise, espera-se contribuir para o debate sobre o aperfeiçoamento do instituto, garantindo que ele cumpra seu papel de forma mais eficiente e efetiva.
- Análise Crítica da Eficiência do Procedimento
A baixa taxa de sucesso do procedimento de recuperação judicial no Brasil pode ser explicada por diversos fatores estruturais e processuais. Dentre os principais entraves, destacam-se:
2.1 Morosidade do Processo e Demora na Concessão do Stay Period
A morosidade do processo de recuperação judicial é um dos principais entraves à sua efetividade, impactando diretamente a viabilidade das empresas que buscam o instituto como alternativa à falência. Analisemos:
O tempo entre a distribuição do pedido e a concessão do Stay Period (período de 180 dias de suspensão das cobranças e execuções, previsto no art. 6º da LRF) é fundamental para garantir que a empresa tenha condições de reorganizar suas atividades sem sofrer pressões excessivas dos credores.
No entanto, na prática, a demora na concessão desse benefício compromete a eficácia do procedimento. Levantamento realizado por Daniel Moller Martinho (2018) analisou 181 processos e verificou que o tempo médio entre a distribuição do pedido e o deferimento do processamento da recuperação judicial foi de 68,63 dias, ou seja, mais de dois meses, o que pode agravar ainda mais a crise da empresa recuperanda.
A análise desses processos revelou que um fator determinante para o atraso na concessão do Stay Period é a necessidade de emenda da petição inicial. Em 83,43% dos casos estudados, o juiz determinou a complementação da documentação antes de decidir sobre o processamento da recuperação judicial.
Essa exigência decorre, em grande parte, do não cumprimento dos requisitos previstos no art. 51 da LRF, que estabelece a documentação obrigatória para a admissibilidade do pedido. Embora a exigência de informações detalhadas tenha o objetivo de garantir maior transparência no procedimento, a demora na sua regularização pode postergar significativamente o início do Stay Period e, consequentemente, aumentar as dificuldades enfrentadas pela empresa.
Além da exigência de emendas à petição inicial, outro fator que influencia a morosidade do processo é a realização de constatação prévia. Em alguns casos, os juízes determinam a nomeação de peritos para avaliar a real viabilidade econômica da empresa antes de deferir a recuperação judicial. Os dados do mesmo estudo indicam que processos que passaram por perícia prévia tiveram, em média, um prazo 38 dias maior para a concessão do Stay Period.
O impacto dessa morosidade pode ser significativo para a recuperação da empresa, pois, durante o período de espera pelo deferimento do pedido, as obrigações financeiras continuam a se acumular, os credores podem intensificar as cobranças e o mercado pode perder a confiança na capacidade de recuperação da companhia.
Em alguns casos, essa demora leva ao agravamento da crise, tornando a falência inevitável. O estudo de Martinho identificou que, dos 181 processos analisados, 29 (16,02%) resultaram diretamente em falência, muitos dos quais enfrentaram dificuldades excessivas na fase inicial.
Nesse contexto, a lentidão na concessão do Stay Period também impacta a dinâmica da negociação entre credores e devedores. Em sistemas mais ágeis, como o Chapter 11 dos Estados Unidos, a proteção contra cobranças é concedida logo no início do procedimento, garantindo à empresa um ambiente mais seguro para renegociar suas dívidas. No Brasil, a demora na análise dos pedidos pode levar os credores a adotarem uma postura mais agressiva, dificultando a aprovação de um plano de recuperação viável. Dessa forma, a morosidade processual não apenas compromete a empresa devedora, mas também reduz as chances de êxito do instituto como um todo.
Portanto, embora a legislação brasileira tenha adotado mecanismos para proteger a empresa em recuperação, a demora na sua aplicação prática compromete a eficácia do processo. A simplificação da fase inicial, a ampliação da especialização dos juízes que atuam em varas empresariais e a implementação de procedimentos mais céleres para a análise dos pedidos podem contribuir para a redução da morosidade. A experiência internacional mostra que um processo mais ágil e previsível favorece tanto a empresa em crise quanto os credores, aumentando as chances de recuperação e minimizando os impactos da falência sobre a economia.
2.2 Falta de Incentivos para Credores
A participação ativa dos credores é essencial para o sucesso da recuperação judicial, mas o modelo brasileiro não oferece incentivos adequados para que os credores quirografários optem pela recuperação em vez da falência.
De acordo com os dados analisados por Martinho (2018), dos 181 processos estudados, apenas 23 (12%) tiveram a adesão de credores parceiros que continuaram fornecendo bens e serviços à empresa em recuperação. Em 88% dos casos, não se verificou a ocorrência de credores parceiros.
A principal tentativa de estímulo para que os credores continuem negociando com a empresa em recuperação está prevista no art. 67 da LRF, que concede um privilégio na ordem de pagamento aos credores que mantiverem fornecimento de bens e serviços durante o período da recuperação.
No entanto, esse incentivo se revelou insuficiente para promover uma adesão expressiva. O estudo apontou que 100 processos (63%) foram extintos ou indeferidos antes da realização da Assembleia Geral de Credores (AGC), evidenciando que, na maioria dos casos, os credores não enxergam vantagens concretas na negociação e preferem que a empresa vá à falência.
Um dos principais problemas é a assimetria informacional entre credores e devedores, já mencionada anteriormente. Como apontado na pesquisa, os credores frequentemente não têm acesso a dados suficientes para avaliar com segurança a viabilidade econômica da empresa recuperanda. Esse desconhecimento faz com que muitos prefiram a falência, onde a previsibilidade da liquidação de ativos pode parecer mais vantajosa do que um plano de recuperação de longo prazo.
Além disso, há casos em que credores estratégicos adotam um comportamento oportunista, rejeitando o Plano de Recuperação Judicial (PRJ) na expectativa de que, em uma eventual falência, possam recuperar uma parte maior de seus créditos.
O impacto dessa falta de incentivos é significativo. Nos 158 processos em que não houve adesão ao modelo de credor parceiro, apenas 37% resultaram na concessão da recuperação judicial, enquanto 63% foram indeferidos ou extintos antes mesmo da AGC. Já nos 23 casos em que houve credores parceiros, a taxa de sucesso da recuperação foi de 100%, evidenciando que, quando há credores dispostos a colaborar, as chances de êxito do processo aumentam substancialmente.
Outro fator que desestimula a adesão dos credores à recuperação judicial é a incerteza quanto ao cumprimento do plano aprovado. Mesmo quando a AGC aprova um PRJ, a empresa recuperanda pode não conseguir cumprir os pagamentos, levando à convolação da recuperação em falência. Isso aconteceu em 17,39% dos casos analisados, reforçando a percepção de risco por parte dos credores. Além disso, o tempo médio entre a aprovação do plano e sua efetiva implementação é elevado, o que pode agravar ainda mais a desconfiança do mercado.
Diante desse cenário, torna-se evidente que a recuperação judicial, na sua forma atual, carece de mecanismos eficazes para incentivar a participação dos credores. Uma possível solução seria o aprimoramento do art. 67 da LRF, tornando o benefício do credor parceiro mais atrativo. Além disso, a introdução de garantias adicionais para os credores quirografários, como a possibilidade de antecipação parcial de pagamentos em determinadas condições, poderia estimular maior adesão ao processo de recuperação.
A experiência internacional mostra que sistemas mais eficientes de recuperação empresarial contam com mecanismos que promovem maior segurança e previsibilidade para os credores. No Chapter 11 dos Estados Unidos, por exemplo, os credores têm a possibilidade de participar mais ativamente da reestruturação, podendo até substituir a administração da empresa caso considerem necessário. Já na França, a legislação prevê um modelo de mediação prévia, que permite aos credores negociarem condições antes do ingresso formal no processo de recuperação, reduzindo o risco e incentivando acordos mais equilibrados.
Portanto, para que a recuperação judicial no Brasil atinja maior efetividade, é necessário repensar os incentivos oferecidos aos credores. Sem estímulos adequados, a tendência será a continuidade do cenário atual, no qual a maioria dos credores prefere a falência à tentativa de recuperação. Reformas que reduzam a assimetria informacional, acelerem o cumprimento dos planos aprovados e ofereçam benefícios concretos aos credores podem aumentar significativamente as taxas de sucesso da recuperação judicial, tornando o instituto mais eficiente na preservação da atividade econômica e dos empregos.
2.3 Tratamento dos Créditos Tributários
Os créditos tributários não estão sujeitos à recuperação judicial, o que representa um grande obstáculo para a reestruturação das empresas em crise. A Lei 11.101/2005 estabelece que tributos não podem ser incluídos no plano de recuperação judicial, impedindo sua renegociação direta no processo e mantendo a empresa devedora vinculada às cobranças fiscais.
O art. 57 da LRF exige que a empresa apresente certidões negativas de débitos tributários como condição para a concessão da recuperação judicial, criando uma barreira adicional para a continuidade de suas atividades. Essa exigência, contudo, já foi flexibilizada em algumas decisões judiciais, diante da ausência de regulamentação adequada para o parcelamento desses tributos.
A Lei 13.043/2014 (BRASIL, 2014) trouxe um parcelamento especial para empresas em recuperação judicial, permitindo a renegociação de tributos federais em até 84 meses. No entanto, essa solução é parcial, pois não contempla tributos estaduais e municipais, que continuam sendo cobrados normalmente.
Além disso, mesmo no âmbito federal, a limitação do parcelamento a um período fixo muitas vezes não é suficiente para que empresas em grave crise financeira consigam regularizar sua situação. Sem um sistema mais amplo de renegociação, o passivo fiscal pode comprometer a eficácia da recuperação judicial, tornando inviável a manutenção da empresa.
Outro problema enfrentado é a insegurança jurídica causada pela falta de uniformidade no tratamento dos créditos tributários. Embora o crédito fiscal não esteja sujeito à recuperação judicial, há uma lacuna legislativa sobre como esses valores devem ser considerados no processo. Algumas decisões judiciais determinam que a empresa não pode ser obrigada a apresentar certidões negativas para obter a recuperação, enquanto outras seguem exigindo essa documentação, o que leva a interpretações divergentes e incerteza para as empresas devedoras.
A assimetria informacional também é um fator que agrava esse cenário. Muitas empresas em recuperação não fornecem informações detalhadas sobre o tamanho do seu passivo fiscal e o comprometimento de seus ativos com dívidas tributárias, dificultando a avaliação real da sua capacidade de recuperação. Isso impacta diretamente a Assembleia Geral de Credores (AGC), pois os credores precisam decidir sobre a aprovação do plano sem conhecer completamente a real situação financeira da empresa.
Na prática, a exclusão dos créditos tributários da recuperação judicial reduz as chances de sucesso do procedimento. Sem a possibilidade de renegociar diretamente com o Fisco dentro do plano, a empresa pode até conseguir um acordo com credores privados, mas continuará enfrentando cobranças fiscais que comprometem seu fluxo de caixa.
Diante dessa realidade, uma possível solução seria a criação de um regime específico de parcelamento tributário para empresas em recuperação judicial, abrangendo não apenas tributos federais, mas também estaduais e municipais. Além disso, a inclusão do Fisco como participante ativo na AGC poderia tornar o processo mais transparente e viável, permitindo negociações que equilibrem os interesses da empresa devedora e da Fazenda Pública.
Sem essas mudanças, a recuperação judicial continuará sendo um mecanismo limitado, incapaz de proporcionar uma solução eficaz para empresas com alto passivo tributário.
2.4 Falta de Especialização dos Juízes e Tribunal Congestionado
A eficiência dos processos de recuperação judicial no Brasil é frequentemente comprometida pela ausência de varas especializadas e pela sobrecarga do sistema judiciário. A Lei 11.101/2005 (Lei de Recuperação e Falências) exige um conhecimento aprofundado em direito empresarial e falimentar para a condução adequada desses processos.
No entanto, muitos juízes não possuem essa especialização, o que pode resultar em decisões menos técnicas e atrasos processuais. A falta de formação específica em matérias empresariais impede uma análise mais precisa das complexas questões envolvidas na recuperação de empresas, afetando negativamente a celeridade e a eficácia dos procedimentos.
A ausência de varas especializadas em recuperação judicial e falências é uma realidade em diversas regiões do país. No estado do Maranhão, por exemplo, não há varas exclusivas para tratar desses casos, o que sobrecarrega as varas cíveis existentes.
Essa situação é particularmente preocupante em cidades como Balsas e Imperatriz, onde a atividade empresarial tem crescido significativamente, aumentando a demanda por processos de recuperação. Em Imperatriz, as varas cíveis acumulam competências diversas, incluindo recuperação de empresas, conforme informações do Tribunal de Justiça do Maranhão. Essa acumulação de funções pode levar a atrasos e a uma menor qualidade nas decisões, dado o volume de trabalho e a diversidade de matérias sob a responsabilidade de um único juiz.
Conforme pesquisa do autor do presente artigo, entre 2017 e 2025, foram ajuizados 64 processos referentes à classe judicial de recuperação judicial no estado do Maranhão. Esse dado, extraído do PJE Maranhão (TJMA, 2025), reforça a crescente demanda por uma estrutura especializada para lidar com tais processos, sobretudo em polos econômicos como Balsas e Imperatriz.
A sobrecarga das varas cíveis e comerciais, aliada à falta de especialização, resulta em um ambiente judicial menos eficiente para a tramitação de processos de recuperação judicial. Estudos indicam que a especialização é uma tendência mundial que busca dar tratamento uniforme à aplicação da lei, com impactos positivos na tramitação processual.
A ausência de varas especializadas pode prolongar os processos, aumentando os custos e reduzindo as chances de sucesso na recuperação das empresas. Além disso, a falta de familiaridade dos magistrados com as especificidades do direito empresarial pode levar a decisões que não consideram adequadamente as nuances necessárias para a reestruturação eficaz das empresas em dificuldade.
Reconhecendo esses desafios, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) emitiu a Recomendação nº 56/2019 (CNJ, 2019), que sugere aos Tribunais de Justiça a promoção da especialização de varas e a criação de câmaras ou turmas especializadas em falência, recuperação empresarial e outras matérias de direito empresarial. O objetivo é aprimorar a atividade jurisdicional, proporcionando julgamentos mais céleres e técnicos, o que fomentaria um ambiente de negócios mais seguro e previsível. A implementação dessa recomendação poderia mitigar os problemas decorrentes da falta de especialização e da sobrecarga das varas comuns.
No Maranhão, a Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Maranhão (OAB/MA), por meio da Comissão de Recuperação de Empresas e Falência, aprovou um requerimento a ser encaminhado ao Tribunal de Justiça do Maranhão, solicitando a criação de varas empresariais especializadas em recuperação de empresas e falências.
Essa iniciativa visa aperfeiçoar a atividade jurisdicional no estado, especialmente em regiões com crescente demanda empresarial, como Balsas e Imperatriz. A criação dessas varas especializadas poderia proporcionar um julgamento mais célere dos litígios empresariais, fomentando um ambiente de negócios mais saudável e confiável.
A implementação de varas especializadas em recuperação judicial e falências no Maranhão poderia trazer diversos benefícios. Além de agilizar os processos, a especialização permitiria uma uniformização na aplicação da legislação, aumentando a segurança jurídica para as empresas em dificuldade e seus credores. Juízes com expertise na área estariam mais aptos a conduzir os processos de forma eficiente, compreendendo as particularidades econômicas e financeiras envolvidas, o que poderia resultar em planos de recuperação mais realistas e exequíveis.
Em resumo, a falta de especialização dos juízes e o congestionamento das varas comuns representam obstáculos significativos para a eficácia dos processos de recuperação judicial no Brasil. No Maranhão, a criação de varas especializadas, especialmente em polos empresariais como Balsas e Imperatriz, surge como uma necessidade premente para atender à crescente demanda e promover um ambiente jurídico mais favorável à reestruturação empresarial.
- Considerações Finais e Perspectivas de Reforma
Portanto, a recuperação judicial foi criada como um instrumento para permitir a reestruturação de empresas em crise e evitar a falência, promovendo a continuidade das atividades empresariais e a preservação dos empregos.
No entanto, ao longo dos anos, tornou-se evidente que o procedimento enfrenta entraves significativos que comprometem sua eficácia. A morosidade processual, a falta de incentivos para credores e a impossibilidade de incluir créditos tributários no plano de recuperação são fatores que contribuem para o insucesso de muitas empresas que recorrem ao instituto.
A demora na concessão do Stay Period é um dos primeiros obstáculos enfrentados pelas empresas que buscam a recuperação judicial. O tempo excessivo entre o protocolo do pedido e a concessão da proteção contra cobranças prejudica a capacidade da empresa de reorganizar suas atividades.
Esse atraso, aliado à necessidade de constantes emendas à petição inicial, torna o processo mais lento e oneroso, dificultando a retomada da estabilidade financeira das empresas em recuperação.
Além da morosidade, a burocracia excessiva também representa um fator de risco para a recuperação judicial. A exigência de documentação extensa e a necessidade de comprovação detalhada da viabilidade econômica da empresa tornam o procedimento mais complexo do que deveria ser. Muitas empresas acabam não conseguindo atender a todas as exigências dentro dos prazos estabelecidos, o que leva ao indeferimento do pedido ou à convolação em falência.
Outro problema recorrente é a ausência de incentivos concretos para os credores, especialmente os quirografários, que detêm a menor prioridade na ordem de recebimento. Sem garantias adequadas e diante da incerteza sobre o cumprimento dos planos de pagamento, muitos credores preferem a falência da empresa em vez de aprovar um plano de recuperação que pode não ser cumprido integralmente. Essa falta de cooperação entre as partes envolvidas reduz as chances de sucesso do procedimento e compromete sua função primordial.
A exclusão dos créditos tributários da recuperação judicial é mais um fator que limita a eficácia do instituto. A impossibilidade de renegociar diretamente com o Fisco dentro do processo de recuperação judicial mantém a empresa devedora sujeita a execuções fiscais, bloqueios de bens e restrições de crédito. Sem uma solução para essa questão, muitas empresas que poderiam se recuperar acabam enfrentando dificuldades intransponíveis e acabam falindo.
A falta de especialização dos juízes e o congestionamento das varas cíveis e empresariais agravam ainda mais esse cenário. A ausência de magistrados com conhecimento específico sobre direito empresarial e falimentar compromete a qualidade das decisões e aumenta o tempo de tramitação dos processos. Além disso, a sobrecarga do Judiciário impede que os casos sejam analisados com a celeridade necessária para garantir a efetividade do instituto.
Diante dessas dificuldades, torna-se evidente a necessidade de reformas estruturais para tornar a recuperação judicial mais eficiente. A criação de varas especializadas, a digitalização do procedimento e a simplificação da fase inicial podem contribuir para um processo mais ágil e acessível. Além disso, a implementação de mecanismos que incentivem a participação ativa dos credores e a ampliação das possibilidades de renegociação de dívidas tributárias podem tornar o instituto mais atrativo e funcional.
A experiência internacional demonstra que sistemas mais flexíveis e ágeis apresentam melhores resultados na recuperação de empresas. Modelos como o Chapter 11 dos Estados Unidos oferecem maior segurança aos credores e permitem que a empresa continue operando enquanto reorganiza suas finanças.
No Brasil, a adoção de práticas semelhantes, adaptadas à realidade local, pode ajudar a fortalecer o instituto e garantir maior previsibilidade e estabilidade às empresas em crise.
Portanto, a recuperação judicial, apesar de sua importância, precisa ser aprimorada para cumprir seu papel de forma mais eficaz. Reformas que reduzam a morosidade, incentivem a cooperação entre credores e empresas e garantam maior previsibilidade ao procedimento são fundamentais para fortalecer o instituto. Somente assim será possível transformar a recuperação judicial em um verdadeiro mecanismo de reestruturação, preservando empresas viáveis, garantindo empregos e contribuindo para o desenvolvimento econômico do país.
O aperfeiçoamento do instituto passa pela revisão de suas principais deficiências e pela implementação de soluções que garantam sua efetividade. A recuperação judicial tem potencial para ser um instrumento eficiente de reestruturação, mas para isso precisa de ajustes que tornem o processo mais ágil, seguro e justo para todas as partes envolvidas. Com as reformas adequadas, será possível garantir que mais empresas consigam superar suas dificuldades e retomar suas atividades de forma sustentável.
REFERÊNCIAS
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